9 ENCONTROS, de Silvana Mâcedo

9 ENCONTROS

SILVADA MACÊDO

CURADORIA JULIANA CRISPE.

ESPAÇO FERNANDO BECK | DE 02 DE MAIO A 20 DE JUNHO

“Fomos, durante muito tempo, embalados com a história de que somos a humanidade. Enquanto isso – enquanto seu lobo não vem –, fomos nos alienando desse organismo de que somos parte, a Terra, e passamos a pensar que ele é uma coisa e nós, outra: a Terra e a humanidade. Eu não percebo onde tem alguma coisa que não seja natureza. Tudo é natureza. O cosmos é natureza. Tudo em que eu consigo pensar é natureza”, Ailton Krenak.

A exposição “9 Encontros”, de Silvana Macêdo, propõe pensar a ecologia decolonial, alinhada à perspectiva anunciada por Krenak, que concebe a humanidade como parte indissociável do cosmos e não nos vê como seres repartidos ou distantes da natureza. Ao mergulhar na Floresta Amazônica, para realizar a pesquisa de pós-doutorado intitulada Reflorestar a Si, a artista desenvolve uma série de trabalhos artísticos a partir de encontros com nove árvores amazônicas: Breuzinho (Protium heptaphyllum), Samaúma (Ceiba pentandra), Apuí (Ficus insipida), Castanheira (Bertholletia excelsa), Pau D’Arco (Handroanthus impetiginosus), Imburana de Cheiro (Amburana acreana), Mulateiro (Calycophyllum spruceanum), Massaranduba (Manilkara bidentata) e Carapanaúba (Aspidosperma nitidum).

Em sua jornada até encontrar cada uma destas espécies, Silvana buscou como fonte de pesquisa o conhecimento das comunidades ribeirinhas, seus saberes ancestrais a respeito das plantas. Iniciou um movimento de aprender a medicina da floresta com uma miríade de pessoas que cruzaram seu caminho, desde a equipe de botânicos do PDBFF-INPA¹, quanto mateiros, curandeiros e indígenas conhecedores de tradições originárias. Assim a artista busca dar forma e sentido à sua experiência, que nesta exposição se desdobra em pinturas, fotografias, instalação e audiovisuais. Não há como pensar em futuros emancipatórios sem reconhecer a importância para nossa sobrevivência de uma das bênçãos maiores do planeta, a Floresta Amazônica. Honrar a ancestralidade é também compreender, acolher e mover ações que colocam a experiência da vida como parte de um todo – plantas, humanos, animais, terra, oceanos.

Ao mesmo tempo, urge perceber que o capitalismo e a supremacia patriarcal branca colocada historicamente como o centro do mundo, e que aqui se instalou desde a colonização europeia, continua sendo um lugar de opressão racial, de gênero, da diversidade e dos ataques ao meio ambiente.

“A ecologia decolonial é uma crítica renovada das colonizações históricas e contemporâneas, bem como de seus legados, crítica que leva a sério as questões ecológicas do mundo. Em primeiríssimo lugar, trata-se de reconhecer que a relação colonial não se reduz a uma relação entre grupos de humanos. Ela compreende também relações específicas como não humanos, paisagens e terras por meio do habitar colonial da Terra. Isso significa que a emancipação da dominação colonial não pode ser pensada unicamente como uma mudança da relação de humanos com humanos, ela implica também uma transformação da relação colonial com as paisagens e com os não humanos, inclusive em suas formas escravagistas. A ecolologia decolonial é, portanto, um prolongamento ecológico das críticas existentes da fratura colonial”, Malcon Ferdinand (Uma ecologia decolonial – pensar a partir do mundo caribenho, 2022).

Um habitar ecológico decolonial propõe indagar os sistemas, compor o mundo com o outro, indo além da ideia de aprender a viver junto, mas de ser em conjunto. Apontar as violências dos desmatamentos ao mesmo tempo em que percebe-se como parte da floresta, em sua exuberância, beleza e esplendor, inclui também fazer ecoar muitos dos gritos promovidos por artivismos²em que a arte torna-se lugar de contemplação e luta. Isso é o que Silvana Macêdo nos instiga a pensar em 9 Encontros. 

¹ PDBFF–INPA Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais, do Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas. https://pdbf.org.br/index.php/apresentacao/quem-somos.
² O artivismo delimita o âmbito de ação que parte do individual, passa pelo coletivo e alcança insuspeitados espaços no qual se localiza o outro. Esta prática desloca o cenário da arte e da política para o espaço público.
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