INVENTÁRIO
14ª BIENAL INTERNACIONAL DE CURITIBA | FRONTEIRAS COLABORATIVAS
BEATRIZ RODRIGUES
CURADORIA DE GUSTAVO REGINATO
ESPAÇO PAULO GAIAD | 31 DE AGOSTO A 03 DE OUTUBRO DE 2019
Imagens fotográficas são apresentadas em diferentes suportes e em relação com outras linguagens, como a pintura, a literatura, o livro de artista, o vídeo e a instalação. Explorando a noção de inventário como ponto inicial, a mostra propõe um pensar sobre os processos de arruinamento de bens culturais materiais, como uma reunião de bens de valor afetivo e social. Beatriz Rodrigues é artista visual e arte educadora. Vive e trabalha em Rio Grande.
APRESENTAÇÃO
Paisagem horizonte (pedra semente), 2019. Fotografias em papel matte, dimensões variadas. Um inventário, muito mais que um arquivo que enumera itens e bens, trata-se de uma invenção. Com a capacidade de resgatar fragmentos antropológicos, coletando imagens e informações, Beatriz Rodrigues, como artista, historiadora e filósofa, apropria-se dos suportes das artes visuais para recriar suas reflexões sobre a ocupação das cidades, o mercado imobiliário, a história da arquitetura e seus processos de demolição e reconstrução, mas acima de tudo, resgatar as memórias que se fazem presentes em suas obras.
Beatriz inventa portanto novas dimensões a serem habitadas em espaços permeados pelo abandono e pela degradação. Seus processos de coleta de imagens e fragmentos de ruínas se iniciaram há mais de dez anos, gerados por inquietações e angústias, pela incompreensão da falta de cuidado com o patrimônio histórico e cultural. Seus processos de coleta são uma tentativa de fazer durar aquilo que tende a ruir e escapar por entre os dedos. Assim como o artista Nuno Ramos, Beatriz começou a arrancar a pele das coisas para ver o que havia debaixo, percebeu que a pele dos tijolos ia virando pó. Como se tentasse capturar o pó com uma peneira, seus trabalhos de inventário são uma pequena fração de moléculas capturadas de uma matéria que se esvai com o passar do tempo. O que permanece é uma invenção, ficção de uma possível realidade inventariada, que já não habita mais as paisagens de onde foram coletadas, mas sim espaços expositivos de arte e reflexões geradas pelo seu contato com o público.
O que antes era um processo de indignação pelo abandono, hoje se torna um processo de observar a natureza das coisas. Se humanos ali já não habitam mais, se ali não há mais mãos que zelam com cuidado, outras formas de vida começam a brotar. Os vegetais começam a reinar, as memórias a sedimentar. A matéria se transmuta, o desapego é inevitável. Se tivéssemos uma melhor compreensão da temporalidade entrópica, talvez não nos debateríamos contra os processos de transformação da matéria, que inegavelmente tende a decair.
A sensibilidade de Beatriz aflora nas soluções que encontra para exibir ao público sua pesquisa de imagens, que começa na fotografia, transborda para o campo escultórico imersivo de instalações e peças fotográficas. Os indícios aqui presentes permitem que você possa recriar este inventário, muito além de tentar descobrir a história destas ruínas, tente vasculhar como estas imagens habitam em você.
Gustavo Reginato | Curador