CONTEMPORÂNEOS
DIEGO DE LOS CAMPOS
CURADORIA DE ANNA MORAES
ESPAÇO FERNANDO BECK | 06 DE JUNHO A 12 DE JULHO DE 2019
A exposição apresenta aguadas de nanquim de grande formato, numa composição de figuras imprecisas que jogam com dualidades e se encontram em um meio-termo de desenho-pintura, traço-mancha, forma-fundo e retrato-paisagem. Diego de los Campos vive e trabalha em Florianópolis e sua produção envolve vídeo, animação, desenho e arte sonora.
APRESENTAÇÃO
Desenho 3, 2018. Nanquim sobre papel, 180x120cm. Sem título, 2018. Nanquim sobre papel, 96x132cm.
É no entre-lugar do disforme, do informe e do não-eu que se encontra a série de desenhos Contemporâneos de Diego de los Campos. Fronteiras se dissolvem em aguadas de nanquim enquanto traços consistentes escorrem na tentativa de dar forma ao informe da forma. Algo entre pintura e desenho, entre traço e mancha, entre figura e fundo, entre a forma e o nada. Um campo incerto e impreciso, indeterminado e desconcertante.
Se em Antirretratos¹ Diego apresentava uma forma humanoide, um humano não humano, em que se evidenciava a questão do retrato, sua atual série estaria situada em um meio termo entre retrato e paisagem. Reflexões de um possível estado de espírito, um estado de ânimo, um retrato de uma paisagem interior ou a paisagem de um retrato. Um interior-exterior fantasmagórico de algo que é e não é na medida que se apresenta.
Diego de los Campos é um artista de ironias e paradoxos: suas obras não cessam de estabelecer relações, desvendar e articular questões sobre a sociedade e o ser contemporâneo. E em que consistiria este ser?
Em sentimentos sobre nanquim, sobre papel, sobre parede, sobre cimentos, sobre a terra violentada por nós que por fim nela vivemos. O ser-criatura-objeto-paisagem de Diego opera talvez como o Odradek² de Kafka: o ser sem forma, impossível de descrever mas que ainda existe; ou o ser que, na tentativa de fugir de si acaba por ensaiar metamorfoses, encerrando qualquer tentativa de definição e apreensão onde cada detalhe engana a forma na aproximação.
Talvez, esta série de desenhos denuncie o ser que exista na medida de sua inexistência: tentativas de humanizar o ser contemporâneo na medida da sua desumanização progressiva e constante. É preciso se aproximar e tomar distância, alcançar e se afastar da forma que, quanto mais se tenta apreender, mais se torna fluida, escorre, derrete, acidifica e corrói qualquer estrutura ou condição.
¹ Série de trabalhos anteriores do artista.
² Franz Kafka, Die Sorge des Hausvaters (1917). Tradução de Roberto Schwarz: “Tribulação de um Pai de Família” (in O pai de família e outros estudos [São Paulo: Paz e Terra, 1978] 21-26), primeira publicação em 1966.
Anna Moraes | Curadora